O que antes era panorama promissor — o marketing de influência como caminho quase automático para resultados — hoje encontra resistência estruturada. O fenômeno da anti-influência, também chamado de desinfluência, tem promovido uma transformação profunda na forma como marcas, criadores e audiência interagem. E não se trata de uma moda passageira: é uma revisão estratégica que exige olhar crítico e reposicionamento.
De expoentes a autenticidade radical
Conforme descreve a matéria da Exame, criadores que rejeitam padrões estéticos e discursos ensaiados estão ganhando força com públicos que valorizam transparência e verdade. Essa anti-influência — ou influenciadores que usam da honestidade radical como veículo de conexão — redefine métricas e expectativas do marketing digital. (Exame, Reddit, mundomapping.com)
Dados apontam que a conversão via mega-influenciadores caiu cerca de 18% de 2021 a 2023, enquanto o mercado de influência dobrou de valor no Brasil, chegando a R$ 40 bilhões em 2023. (Eduka) Em resumo: mais investimento, menor retorno. E é nesse freio brusco que os criadores autênticos emergem como alternativa mais efetiva e verdadeira.
Segundo levantamento da Latam Intersect PR, mais de 77% dos consumidores da América Latina preferem avaliações de usuários comuns em vez de conteúdo patrocinado por influenciadores. No Brasil, apenas 37,7% confiam em influenciadores pagos. Isso revela uma mudança de comportamento: o público quer ouvir pessoas reais antes de comprar. (E-Commerce Brasil)
A pesquisa do Typeform reforça essa desconfiança: 71% dos consumidores já se arrependeram de compras feitas com base em recomendações digitais, citando falta de autenticidade e transparência como principais causas. (Mundo do Marketing)
Ou seja: o consumidor já entendeu a lógica das publis e espera por apontamentos reais antes de decifrar o marketing por trás do marketing.
Comunidades como poder real
Os anti-influenciadores não falam para massas; falam para nichos onde se sentem ouvidos. Perfis como o “Café com Teu Pai” e o "moço da lancheira" escalam com vídeos simples e verdades diretas, conquistando engajamento 30 vezes maior que influenciadores tradicionais num mesmo segmento. (Tribuna de Minas)
Esses grupos radicais criam uma linguagem própria, com códigos, ironia, e intensificam o engajamento com um público que se vê refletido na mensagem. Para marcas, isso exige repensar sua estratégia: não se trata mais de spray e alcance, mas de pontualidade e profundidade.
Mesmo com investimentos altos, 18% das marcas evitam trabalhar com influenciadores após experiências negativas: falta de entrega, ausência de nota fiscal, posicionamento político discrepante com a marca, baixa qualidade de conteúdo e engajamento inflado por números falsos são os principais problemas. (Promoview)
A conclusão é clara: quantidade não equivale a eficácia — e, muitas vezes, complica mais do que ajuda.
Uma tendência crescente no TikTok é o de-influencing — criadores que incentivam o não consumo de produtos populares, alertam sobre compras desnecessárias ou produtos que não entregam o que prometem. Esse movimento acumulou mais de 150 milhões de visualizações. É protesto contra o marketing exagerado, e também sinal de profissionalismo opinativo. (revistaquestaodeciencia.com.br, apnews.com)
E isso ressoa diretamente com a postura dos anti-influenciadores: não vender ativamente, mas influenciar com honestidade.
É irônico: os criadores que rejeitam o sistema são os que mais engajam. Isso acontece porque autenticidade irreverente atrai fidelidade emocional. Eles não querem agradar; querem causar conexão. E paradoxalmente, isso os torna poderosamente influentes.
Esse tipo de comunicação sem script, quase vernacular, tem mais credibilidade que qualquer conteúdo patrocinado demais. (Tribuna de Minas, Eduka)
O que isso significa para o marketing digital
Desde a visão de estrategista digital — que sou há anos — vejo que o marketing de influência entrou numa nova fase:
- Taxas de conversão com influenciadores tradicionais caindo exigem reposicionamento das marcas.
- Micro e nano influenciadores de nicho agora são preferidos, por credibilidade, engajamento e custo-benefício. (Promoview, Tribuna de Minas)
- Regulação global avança, como França exigindo transparência e padrões em conteudos patrocinados. (time.com)
Marcas buscam guarda-chuva narrativo, não rostos de alcance — desejam parcerias autênticas, onde criador propõe conteúdo, não apenas promove.
Eu experimento essa transformação dentro da Doisde Publicidade e dos projetos outdoor que lidero. Marcas buscam criadores que falem com verdade, que entendam o público e entreguem valor real — não apenas exibam estatísticas.
Eu já vi campanhas com macro influenciadores falharem por falta de alinhamento entre público e mensagem real, enquanto criadores menores gerarem conversão e reconhecimento contínuo. Para mim, autenticidade passou a ser mais poderosa do que qualquer investimento em alcance artificial.
O caminho que acho recomendável:
- Invista em criadores com autoridade de nicho, alinhados com valores da marca.
- Priorize conteúdo que educa, provoca e converte, mesmo quando é polêmico ou incômodo.
- Veja o influenciador como criador de diálogo, não como cara de marketing.
- Cobrança de resultados deve incluir engajamento qualitativo, retenção e feedback real do público.
O marketing de influência está em um ponto de inflexão. A era dos anti-influenciadores amplia um paradigma: não é mais sobre ser visto, mas ser ouvido com verdade. A lógica mudou do “quantos me seguem” para “quantos me sentem”.
E isso demanda uma mudança de mentalidade estratégica: repensar pública, formatos, parceiros e narrativas. O futuro não é sobre robôs, mas sobre pessoas — mesmo aquelas que rejeitam o marketing convencional.
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